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ATENÇÃO! Estamos em obras.Desculpe pelo transtorno – Parte 2 de 2.

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(Ding-dong)
— Oi.
— (Falando rápido, parecendo nervosa ou ansiosa) Oi. Eu sou sua vizinha de cima, sou do 202. ‘Tô curiosa com a sua obra, ela tá durando quase um ano. Você é toda misteriosa, nem sequer participa do grupo de Whatsapp ou das reuniões de condomínio. Queria saber se está tudo bem.
— Respira. Você ‘tá bem?
— ‘Tô bem! Parece o oposto? Eu te assustei? Olha, desculpa!
— ‘Tá tudo bem. Por que exatamente você veio até a minha porta?
— Por causa do maldito ar-condicionado. (Choro) Você tem? Tem alguém, que instale, p’ra indicar?
— Tenho! Vou pegar o cartão dele. Quer entrar? Vou pegar um copo d’água p’ra você.
— Desculpa. Eu nem sempre sou assim. É meu namorado. Tem que ser tudo do jeito dele. Ele tem me tirado do sério.
— É? Você já disse isso a ele?
— É o que eu mais faço da minha vida há anos. Estou quase desistindo de tudo. Perai… Seu apartamento não está em obras. Como assim? E a placa? E os boatos?
— Eu que estou em obras. Sai de um relacionamento conturbado e estou me reconstruindo. Os vizinhos falam demais, especulam demais, sabe? Esse é o cartão do moço do ar e esse é o meu, sou psicóloga. Se quiser se conhecer melhor, liga p’ra mim. Podemos começar uma obra juntas. Você conseguirá se conhecer melhor e salvar o seu relacionamento.
— O seu relacionamento consertou?
— Infelizmente, eu construía e ele desfazia. Uma de nossas brigas foi ouvida por algum vizinho enxerido e caiu no grupo do Whatsapp. A base de qualquer relacionamento é o diálogo e por isso que eu perguntei se você já tinha dito a ele que acha que tudo sempre precisa ser do jeito dele. O meu ex resolveu despejar tudo em mim de uma vez como se eu fosse uma caçamba. Foi duro aguentar.
— Poxa! Desculpa. Eu sou uma grossa mesmo.
— Você só ‘tá triste. Volte para o seu apartamento, seu namorado ‘tá te esperando para pagar o rodízio.
— (Corada) Como você soube?
— Algum vizinho ouviu e colocou no grupo. A gente precisa tomar cuidado com o que diz. Às vezes, as paredes têm ouvidos; outras vezes, os ouvidos têm paredes.
— Você ‘tá no grupo?
— Pois é, entrei ontem…

ATENÇÃO! Estamos em obras.Desculpe pelo transtorno – Parte 1 de 2.

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— Já reparou o tempo que ‘tá durando a obra da nossa vizinha debaixo?
— Quase um ano. É muito curioso.
— A placa continua lá?
— Sim, com dizeres em letras garrafais “ATENÇÃO! Estamos em obras, desculpe o transtorno”.
— Você ouve barulho?
— Que nada! É uma obra estranhamente silenciosa. Você viu os boatos que estão rolando no grupo do Whatsapp? Dizem que em uma semana ela constrói e na outra, desfaz.
— Que estranho! Ela faz parte do grupo?
— Capaz.
— Um imóvel tão pequeno. Haja criatividade para ficar refazendo as coisas. Criatividade e dinheiro. Você já conversou com ela?
— Bom dia, apenas. Pelo menos é educada.
— Eu te desafio a tocar a campainha dela e perguntar sobre a obra.
— E eu ganho o que se eu for?
— Hm… Eu pago um rodízio de comida japonesa. Topa?
— Comida é sempre meu ponto fraco. Ajuda na abordagem. Vou falar o quê?
— Pergunta se ela tem indicação de alguém que instale ar-condicionado. A gente ‘tá mesmo pensando em comprar um.
— Eu não sei se é uma boa ideia. O preço que ‘tá a energia.
— Achei que isso já ‘tava definido.
— Não quero brigar.
— Ninguém ‘tá brigando aqui.
— Tem que ser tudo sempre do seu jeito.
— Tá maluca? Eu só fiz o comentário. Não precisamos comprar se você não quiser. Eu hein?!
— Nem pense em me chamar de maluca de novo. Eu ainda vou dar motivo para ser tratada como uma maluca.
— Amor, se acalma!
— Eu ‘tava calma, mas a sua função na terra é tirar a minha paz.
— Poxa, no começo do nosso namoro você dizia que a minha calma te acalmava…
— No começo… Isso faz quantos anos? As pessoas mudam. Vou lá na vizinha.
— ‘Tá bem!